quinta-feira, 6 de novembro de 2008

6 de Novembro de 2006 é uma data para não esquecer, pelos piores motivos. Às 6h30 da manhã, a Elisa liga para a nossa casa em Lichinga, para nos dizer que tinha havido um segundo assalto à missão de Fonte Boa e que, desta vez, as consequências tinham sido bem mais terríveis: a Lina tinha sido apanhada pelos ladrões ao tentar fugir e tinha sido assassinada.

A notícia atingiu-me com um choque imenso. Lembro-me ainda de me encostar à porta, sem forças, e de me deixar escorregar até ao chão, agarrado ao telefone, completamente sem forças ou palavras que conseguissem significar algo naquele momento. A Lina, a "prima", aquela mulher forte e decidida, que dava tudo o que tinha e não tinha por quem precisava, tinha desaparecido para sempre. Ia respondendo automaticamente à Elisa, sem saber muito bem o que dizia. Nem sequer conseguia chorar.

Desliguei e fiquei ali a olhar o vazio, completamente atordoado pela notícia. Levantei-me e dirigi-me ao quarto da Rita. Entrei, acordei-a e pedi-lhe que viesse comigo ao quarto da Carla, pois precisava de falar com elas. Não sei que cara tinha ou com que tom de voz falei, mas a Rita nem sequer esboçou um resmungo por estar a acordá-la tão cedo. Levantou-se e fomos para o quarto da Carla. Acordei-a também e sentei-me na borda da sua cama. Calmamente, fui explicando o que tinha acontecido. A notícia deixou-as muito abaladas, sem resposta. Lembro-me de estarmos ali os 3, em silêncio, sem saber o que dizer ou o que pensar.

O assunto correu depressa o mundo missionário de Lichinga e rapidamente começaram a surgir as primeiras palavras de conforto. O Pe Joaquim foi o primeiro a chegar, naquele seu jeito solene e ao mesmo tempo amigo e reconfortante, para se disponibilizar para o que fosse preciso. Depois, todos os outros elementos da equipa missionária quiseram fazer-se solidários connosco e foram aparecendo lá em casa. Palavras de amizade e fraternidade, que pouco atenuavam a dor que sentia. À medida que o torpor ia desaparecendo e ia acordando para a realidade, tornavam-se mais dolorosas as recordações que corriam a minha memória da nossa passagem em Fonte Boa, do campo de trabalho na Figueira da Foz (parvo, pá :) ) – eu era suposto ter estado com a Lina em missão, mas fui desviado apenas à ultima da hora –, dos encontros temáticos, das conversas, das brincadeiras…

De Portugal vinham também telefonemas preocupados dos pais, dos amigos e da direcção, procurando saber como estávamos a reagir e garantindo que tínhamos tudo o que precisávamos. Não tinha, pois já não tinha a minha “prima” comigo, já não ia poder rever o seu sorriso, apoiar-me na sua força como o fiz naquela semana dura de reconstrução da casa do Sr Arlindo. Tudo tinha ido pelo ar. Por causa de um mísero assalto motivado nem se sabia porquê, tudo tinha acabado em desgraça.

O dia terminou com uma eucaristia lá em casa em memória da Lina, com a presença de toda a equipa missionária (o próprio Bispo, D. Hilário, enviou o seu abraço, pois estava em visita pastoral longe). Um momento forte e bonito, de comunhão e amor por alguém que tinha desaparecido da terra mas não dos corações de quem a conheceu.
Foi um dia difícil, que recordo hoje como se tivesse acontecido ontem, por estar tão fresco na minha memória.
Sei que estás aí, “prima”, a olhar por nós, e esse é o único pensamento que me reconforta quando penso em ti, o que acontece muitas vezes, como sabes.
Fica a devida homenagem no dia de hoje, para que a memória não se apague e mais gente conheça esta extraordinária Mulher que deu a vida pela Missão.

Por Ti, Lina, só por Ti… (parvo, pá!)

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