quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Comecem por ler isto:


"Caros escuteiros: 

Se já vistes a peça Peter Pan, haveis de recordar-vos de como o chefe dos piratas estava sempre a fazer o seu discurso de despedida, porque receava que, quando lhe chegasse a hora de morrer, talvez não tivesse tempo para o fazer. Acontece-me coisa muito parecida e por isso, embora não esteja precisamente a morrer, morrerei qualquer dia e quero mandar-vos uma palavra de despedida. Lembrai-vos de que é a última palavra que vos dirijo, por isso meditai-a. 

Passei uma vida felicíssima e desejo que cada um de vós seja igualmente feliz. Crei que Deus nos colocou neste mundo encantador para sermos felizes e apreciarmos a vida. A felicidade não vem da riqueza, nem simplesmente do êxito de uma carreira, nem dos prazeres. Um passo para a felicidade é serdes saudáveis e fortes enquanto sois rapazes, para poderdes ser úteis e gozar a vida quando fordes homens. 

O estudo da natureza mostrar-vos-à as coisas belas e maravilhosas de que Deus encheu o mundo para vosso deleite. Contentai-vos com o que tendes e tirai dele o maior proveito que puderdes. Vede sempre o lado melhor das coisas e não o pior. 

Mas o melhor meio para alcançar a felicidade é contribuir para a felicidade dos outros. Procurai deixar o mundo um pouco melhor de que o encontrastes e quando vos chegar a vez de morrer, podeis morrer felizes sentindo que ao menos não desperdiçastes o tempo e fizestes todo o possível por praticar o bem. Estai preparados desta maneira para viver e morrer felizes - apegai-vos sempre à vossa promessa escutista - mesmo depois de já não serdes rapazes e Deus vos ajude a proceder assim. 

O Vosso Amigo 
Baden Powell"

Esta carta, para quem não sabe, foi escrita há pouco mais de 70 anos, por este senhor, Baden-Powell, fundador do escutismo. É impossível lê-la e não deixar de ficar maravilhados com a lição de vida que ela, só por si, encerra. Quanto mais não fosse, apenas esta carta seria um guia para um vida feliz.

Mas BP não se limitou a escrever uma carta. BP teve a visão de criar um movimento juvenil, baseado no crescimento individual e na vontade própria, que permanece hoje como o maior movimento associativo juvenil do mundo. Somos cerca de 30 milhões em todo o mundo, e existimos em todos os países, com exceção daqueles cujo governo impede, e que são apenas 6.

Muito do que eu hoje sou, devo-o ao escutismo, movimento para o qual entrei quanto tinha 8 anos. Fiz amigos para a vida, vivi aventuras, aprendi coisas novas, sofri, preocupei-me, stressei-me, alegrei-me, emocionei-me... toda uma vida ligada a este movimento, que guardo no meu coração e que para sempre me marcará.

Quando estava com os lobitos, recebia os pais que chegavam de novo com os seus filhos e explicava-lhes que isto não era um movimento qualquer. Ainda hoje, não encontro nenhum movimento melhor do que este, no sentido em que trabalha todos os aspetos do crescimento individual de cada jovem. No início, os pais assentiam com a cabeça, mas via-se nos seus olhos que não compreendiam muito bem. A meio do ano, no entanto, já estavam envolvidos em tudo e compreendiam bem a exigência desta proposta, não só para a criança, mas para os pais, que se comprometem a entrar num mundo que vai mudar a sua vida para sempre.

Guardo para sempre comigo histórias que nunca esquecerei. Algumas não poderão ser contadas ou partilhadas com todos, lamento. Mas outras sim. Deixo aqui uma das histórias que nos últimos tempos mais me marcou, de uma lobita que eu adoro, mas com quem infelizmente já não estou. Quando chegava ao final do primeiro acampamento da D., caiu uma carga de água de todo o tamanho. Mal refeita de um acampamento que tinha acontecido na noite mais fria do ano, a D. chega ao carro com a mãe completamente encharcada, tanto em água como em lágrimas. Chorava por todo o lado, e a mãe e o pai não sabiam já o que lhe fazer. "Pronto, D., não chores", pediu a mãe. "Não tens de vir mais aos escuteiros, não te preocupes, acabou-se, não tens de andar mais à chuva ou ficar assim", disse a mãe para a acalmar. O choro aumentou e ela diz "Não, eu quero voltar, eu adorei o acampamento, não quero sair dos escuteiros". Os pais voltaram-se um para o outro e devem ter pensado "mas que raio?". O que é facto é que a D. não saiu dos escuteiros, continuou com mais força e hoje está noutro agrupamento a fazer a sua caminhada. A história foi partilhada pela mãe num conselho de pais um tempo depois e permaneceu como prova da força que este movimento dá a quem dele faz parte, e ainda hoje me emociono só de pensar nela. Esta é a força do movimento que BP criou há mais de 100 anos atrás, e que hoje continua viva. Quem aqui entra e quem abre o coração a este movimento, ganha uma nova vida, uma nova força, e torna-se alguém melhor, fisicamente, emocionalmente, inteletualmente, espiritualmente, afetivamente e socialmente.

Por tudo isto e muito mais, obrigado, BP, por fazeres de mim, e de milhões de pessoas, aquilo que hoje somos.

Sempre alerta, para servir, e da melhor vontade!



1 comentário:

Boto disse...

Uma experiencia de vida para toda a vida! Algo que está sempre cá dentro! :)