sexta-feira, 2 de julho de 2010

Há dias uma futura mãe comentava comigo a angústia que tinha. Um teste de rastreio alertou para a possibilidade do filho que aí vem sofrer de Síndrome de Down. Não sabe ainda ao certo, e só o saberá quando fizer a amniocentese, um procedimento que tira todas estas questões a limpo.

Dizia-me então a amiga que sempre foi contra o aborto, mas que agora, que o assunto era directamente com ela, que a certeza que tinha dava lugar à dúvida. As implicações de tempo, o negócio próprio que possui que seria difícil de gerir, enfim, um sem número de razões pelas quais ela colocava em dúvida aquela oposição tão forte ao aborto que sempre tinha demonstrado.

Quando nos toca a nós, tudo pia mais fininho. É fácil opinar quando não nos diz respeito, mas não deveriamos procurar sempre pensar sobre o que dizemos e assumi-lo de forma coerente? Não é só a questão da minha amiga. Esta reflexão diz respeito a tudo o que dizemos, a tudo sobre o qual opinamos. Posso eu, em consciência, dizer que sou contra o aborto e depois praticá-lo «porque a minha situação é diferente das outras»? Posso eu afirmar-me contra a precariedade no trabalho e depois ter empregados a meu cargo que exploro à máxma extensão da lei ou até fora dela? Posso eu afirmar que não vou aumentar os impostos e depois fazê-lo, sem considerar outras opções nem ouvir outros intervenientes que sugerem soluções diferentes? Posso eu prometer atingir determinados objectivos e depois nem me esforçar para lá chegar sequer perto? Posso, porque no mundo em que vivemos o que é verdade hoje pode ser mentira amanhã, e assim podemos mudar de opiniões, de valores e de posições quando entendermos e mais nos convir.

Isto é uma constatação e uma reflexão, não uma condenação. O caso em particular é doloroso, e eu só espero conseguir ser coerente comigo mesmo quando e se a situação me for colocada directamente a mim, mas muitas outras coisas na nossa sociedade são assim, e aí é inevitável pensar até que ponto não temos nós uma sociedade cada vez mais destruturada devido a esta nossa flutuação de opiniões e valores.

1 comentário:

Fúria dos Dias disse...

Olá RIcardo,

As mudanças são mudanças, independentemente daquilo que daí possa advir. Só a consequência da mudança é que pode ditar se a mesma foi boa ou não, e olha que tenho razões para isso, acredita.

E foi com base na mudança que te encontrei neste mundo paralelo que é a Internet. O tempo da adolescência é sempre um tempo de memórias e mudanças. E foram essas memórias que me levaram a pesquisar no Google pelo Ricardo Perna, aquele rapaz que era o meu vizinho e com quem passava os tempos na bola, no ping-pong ou na bike, sempre a calcar os velhos tempos da Charneca.

Os tempos são outros, mas os sentimentos mantém-se os mesmos. Pois é, meu caro, podemos não falar há muito, muito, mas mesmo muito tempo, mas continuamos por aqui...

Manda-me depois um mail, para pormos as coisas em dia,

Daniel